domingo, 6 de junho de 2010

I chose to live

Sinto a porta do quarto arrastar
Do rumor presente da morte.
Está quase, é esta a nossa sorte
Diz-me, baixinho, hábil esperar.

Um reflexo relâmpago entrou
Entre os intervalos da persiana.
Tudo está calmo, sinto que vou
Ouço o desembainhar da catana

Espere, sei que temos de partir
É só o tempo de me despedir.

E abro a mesinha de cabeceira.
Foge pó, álbum de fotografias.
Volto após uma viagem inteira
De muitas noites mas tantos dias.

Fui um homem bem sucedido.
Fiz feitos de uma ovação mundial
E feitos me têm agradecido.
Fiz e provei da pedra filosofal.

Mas quanto esforço eu suportei,
Quanta dor indomável, aguda
Mordendo a língua eu aguentei!
Quanto neguei desistir sem ajuda!

A minha história foi só combater
Em nome do que sonhava obter.

Abro o álbum de recordações
E leio orgulhoso as legendas.
"Noite das vinte comemorações"
"Trigésimo prémio das lendas"
"Produção no ensaio de noventa"
"Visita a casa, praça de multidões"
"Com o presidente Coronel Buendía"
Folheio décadas, mão tão lenta,
Mas cada uma está vazia.

Não há nenhuma fotografia.

Talvez do trabalho não pausasse,
Não tive um amigo que as tirasse.

Não, não quero realizar o querer
Eu escolho simplesmente viver.
Mas já a porta rumor se abria...

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